"Agora que jà pouco falta"
“(…)
Nao sei se a 25 de Fevereiro começo a escrever. Mudo de posiçao na cadeira, volto a pàgina,
pergunto
- Como é que se faz um livro?
porque continuo sem saber como se faz um livro. Nao me acho capaz de explicar como fiz os que até agora se publicaram, o que lembro melhor é o esforço enorme e, por vezes, mais raramente, uma alegria indizivel. Ainda existirà algum em mim? O mar e o cacto a seguir ao muro, a oscilar rigidamente. Agarra-te ao teu fiozinho de esperança, experimenta. Começa a preparar a mao, coisa que contigo leva tempo. Tenta que aquilo que existe em qualquer parte tua caminhe na direcçao certa onde as palavras te esperam, adormecidas. Acorda-as devagarinho, nao escutes os passos da insonia, tac, tac, tac, no corredor. Tens 10 anos, 20 anos, tens todas as idades ao mesmo tempo, estàs cheio de medo mas começa. O mar, o cacto, o sol, os pombos. Deixa tudo o que nao seja o livro e começa. Se tiveres sorte, é o teu livro. Se tiveres ainda mais sorte o teu ultimo livro, a razao de teres nascido. Depois, sem te voltares para tràs, acenas adeus à medida que te afastas para um jardim de reformados até que a morte te diga
- Ja vai sendo tempo, filho
e poderàs sorrir-lhe como a uma namorada antiga que nunca envelheceu.
Sorrir-lhe
(entendes o que eu digo?)
numa mistura de timidez e confiança,
porque
(entendes mesmo o que eu digo?)
te tornaràs feliz e eterno.”
por Antonio Lobo Antunes, in Visao, 21 de Fevereiro de 2008
(às vezes nao percebo, mas sinto o que ele escreve. Esta cronica em particular està extraordinaria. Trazida pela Carol hoje, directamente de Lx.)
1 Comments:
também gostei :)
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